"Quer você acredite que pode ou que não pode, geralmente você está certo".

(Henry Ford)


____________________ TEA (Transtorno Espectro Autista)






sábado, 4 de abril de 2015

Dia do Autismo: uma vida de dedicação para lapidar joias raras

02/04

Fotos: Wilson Filho/Cidade Verde

Jucyara trocou de profissão após o diagnóstico do filho Gusthavo: "cada evolução é uma conquista"
Por Rayldo Pereira
rayldopereira@cidadeverde.com
"Meu filho é meu sonho, minha joia rara", é comum ouvir frases como essa de uma mãe amorosa. Mas e se você descobrisse que seu filho é autista, como reagiria? É com esta consciência de que um filho é, de fato, uma joia rara que Jucyara Ibiapina, de 31 anos, fala de seu filho, Gusthavo Ibiapina, de apenas 10 anos, que tem o diagnóstico de autismo clássico. "Não foi fácil, foi doloroso, mas cada evolução é uma conquista", comemora a mãe que já vê no filho imagens de um futuro que, quando recebeu o diagnóstico, não via.
Descoberta
Jucyara começou a perceber que o filho tinha autismo logo que ele completou dois anos. Segundo ela, o primeiro foi diagnóstico era de que ele estava inserido no chamado "espectro autístico", que engloba uma série de características dos autistas. No início o tratamento aconteceu com a intervenção de medicamentos e em seguida as terapias. Somente aos seis anos uma neurologista concluiu o diagnóstico, Gusthavo realmente se enquadrava como autista clássico. 
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Características que podem ajudar os pais a identificarem o autismo

Falta de interação social:
a criança age como se não estivesse
vendo ou ouvindo os familiares

Dificuldade de comunicação

Comportamento repetitivo e esteriotipado: a criança faz, por exemplo, movimentos repetitivos com o corpo ou com membros.

Apego exagerado a um objeto em detrimento a outros como sacolas, galhos, canudos, etc.
 
"Ele não olhava no rosto da gente, se espantava e tinha um gesto repetitivo com a mão. Ele desenvolveu o sentar, o engatinhar normalmente e quando passou para fala chegou até a balbuciar mais ou menos, mas ao completar dois anos parou de falar. Só apontava, chorava muito, ficava muito nervoso, irritado, falávamos com ele e ele não olhava. Chegamos a fazer exames de audimetria para saber se ele tinha problema de surdez já que ele não identificava sons e a percepção dessas características nos levaram a um rápido diagnóstico", explicou a mãe.
Dor e superação
Jucyara relata que os anos até o diagnóstico foram dolorosos e que as imagens mentais que criava para o futuro do seu filho eram desanimadoras. Porém, junto a isso, a alegria e a superação de acompanhar a evolução do filho a deram força para continuar.
"Eu sentia impotência pois imaginava que o erro estava comigo por ele ter essa patologia. Tive depressão e um período de tristeza muito grande. Quem me ajudava muito era minha mãe. Ela nunca ficou no mesmo patamar que eu de tristeza e me dava sustentação. A gente sente que a culpa é nossa, que há um erro nosso e a a gente que proporcionou isso ao filho. A primeira prospecção que a gente faz é que os filhos não vão ter nada que uma criança normal tem e quando a gente começa o tratamento que vê todos os progressos e a evolução que ele tem, a gente diz: 'poxa ele vai poder ter uma vida feliz e de qualidade'. Podemos dizer que as pessoas podem compreender ele, ele vai ter oportunidade de ser inserido na sociedade e vai poder ser participante dela. Não só atuante, ele vai ser participante daquela sociedade", comemorou Jucyara.
"A primeira prospecção que a gente faz é que os filhos não vão ter nada que uma criança normal tem e quando a gente começa o tratamento que vê todos os progressos e a evolução que ele tem, a gente diz: poxa ele vai poder ter uma vida feliz e de qualidade"
Jucyara, mãe do Gusthavo, de 10 anos de idade
Depois de superar as dificuldades em seu interior, começa o desafio externo, que é enfrentar as dificuldades de inclusão para a inserção de crianças com autismo em escolas de ensino regular. Instituições como a AMA (Associação de Amigos do Autista) em Teresina, chegam a ter uma fila de espera de 100 pessoas para novas vagas. Jucyara relata que a experiência de mudança de escola é traumática, mas que com a insistência e o interesse dos pais, é possível sim, inserir a criança autista na escola. Nesse ponto, Jucyara reforça a importância da AMA no aprendizado e desenvolvimento do filho, que é acompanhado pela instituição.
AMA
A associação atende hoje cerca de 120 famílias e é a única instituição que oferece atendimento especializado. Rosália Sousa Oliveira, diretora, explica que a baixa oferta de vagas se deve a necessidade de um acompanhamento individualizado e especial aos atendidos, e por conta disso há longas filas de espera. "Sabemos que nossa estrutura não é suficiente e principalmente a quantidade de profissionais que nós dispomos também não é, mas fazemos um tratamento profissional especializado e clínico e por isso esse atendimento não pode atingir grandes grupos", complementou.

Rosália dirige a AMA, entidade que hoje atende 120 famílias
A associação funciona em um prédio cedido pelo Governo do Estado, mas não recebe recursos públicos para manter seu funcionamento. Através de um convênio, profissionais do Governo são enviados para trabalhar na instituição. Foi o caso de Rosália, que por ter uma sobrinha com síndrome de Down e o marido com uma deficiência física, acredita ter escolhido o local para construir sua carreira profissional. Desde 2005 na associação, Rosália comemora as conquistas mas ressalta que muito é preciso evoluir ainda neste tipo de atendimento. Emocionada, a diretora se orgulha em defender a causa, que é lembrada em especial por todo o mundo neste dois de abril, dia internacional do autismo.
"Sinto-me muito feliz em poder estar colaborando e contribuindo de alguma forma com muitas famílias, adolescentes e adultos porque sei que todos só contam com a gente. Quando eles chegam aqui, a última porta que estão batendo é a porta da AMA", relatou a pedagoga.
Arte e atividades
Uma das atividades que mais chama a atenção dos pais e profissionais que trabalham na AMA é a ligada a arte. As crianças desenvolvem pinturas e trabalhos com massa de modelar, que podem ser vistos pelos visitantes na parede da sala de artes da instituição. Cores alegres e desenhos que expressam as emoções mais desconhecidas da mente autista, ganham forma através do traço. "Sem dúvidas este é um dos nossos principais trabalhos e nele é possível observar, assim como na música, grandes destaques destas crianças", pontuou a diretora.
Neste momento a entrevista é interrompida por Gusthavo, que brinca com a massinha de modelar e sorridente corre para me contar sua nova ideia: "quero construir um lindo zoológico para ficar no lugar onde já tem um. Nele terão vários bichos e até uma lanchonete e uma loja de presentes", conta o garoto, que interage e explica detalhadamente cada setor do seu novo zoológico. Momentos como esse, para a mãe Jucyara, justificam e fazem valer todas as dificuldades. "Ver meu filho que nem falava interagindo com outras pessoas e até cantando me dá mais noção da importância que a AMA tem na vida dele. Eles são sua segunda família", completa.
Caminhos a seguir
Jucyara acrescenta que o primeiro passo de uma mãe na luta pela evolução do filho é conhecer tudo que é oferecido e que está ao seu alcance para o tratamento. Para ela, a melhor maneira de começar a fazer isso, foi largando o curso de veterinária que fazia, para encarar a sala de aula de Educação Física, onde pretende se especializar em psicomotricidade para atender não só o filho, como outras crianças que sofrem com as mesmas limitações.
Foto: Arquivo Pessoal

Raul Pereira, estudante de Educação Física que pretende se especializar no atendimento a crianças com necessidades especiais
Assim como Jucyara, há em Teresina, outros exemplos de estudantes que desejam atender a esse público em especial. É o caso de Raul Pereira, de 23 anos. O jovem cursa o 6º período e Educação Física na Universidade Federal do Piauí, e garante que irá se especializar no atendimento a crianças com necessidades especiais. "Eu tive o exemplo dentro de casa, ao conviver durante toda a infância com meu melhor amigo, portador de uma síndrome, mas isso pouco importava para a nossa amizade. Trabalhar e tratar crianças com esse tipo de necessidade me leva além e me traz de volta a alegria e os sentimentos mais puros que pude conhecer e sentir", comentou o jovem.
"Trabalhar e tratar crianças com esse tipo de necessidade me leva além e me traz de volta a alegria e os sentimentos mais puros que pude conhecer e sentir"
Raul Pereira, estudante de Educação Física 
Para os profissionais que se interessam pela área, o reconhecimento vem rápido, a prova é que Raul já é estagiário de uma academia na zona Sudeste de Teresina, onde  os pais de alunos com necessidades especiais já aguardam ansiosos sua formação. "Os pais procuram e como ainda não sou formado, não posso atende-los, mas hoje tenho certeza que ao me formar, seguirei esse caminho", acrescentou o estudante.
Exemplos como o de Jucyara e Raul, que dedicam sua formação e projetos de vida aos autistas, por exemplo, motivam e alimentam ainda mais em Rosália, diretora da AMA, o sentimento de que a luta não terá fim e de que a cada dois de abril a memória se manterá viva. "Estamos aqui e precisamos ser lembrados. A cor azul dos monumentos não os torna apenas bonitos. Nos engrandece e desperta na sociedade a lembrança de que os autistas merecem seu espaço garantido na sociedade", concluiu.


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